Rio de Janeiro

Porta-voz da PMERJ é exonerada após divulgação de vídeo criticando jornalista

[Foto: Divulgação/Twitter]

O Governador em exercício do estado do Rio de Janeiro, Claudio Castro (PSC), decidiu na tarde desta quarta-feira (09/12), exonerar a coordenadora de comunicação social e porta-voz da Policia Militar (PMERJ), tenente-coronel Gabryela Dantas. A decisão ocorre após um vídeo divulgado em uma rede social da PMERJ, em que a tenente-coronel critica um jornalista do grupo Globo.

Na noite desta quarta-feira (09), Claudio Castro, utilizou de uma rede social para posicionar-se sobre a exoneração. O governador em exercicio disse que confia no trabalho dos policias que possuem a missão de servir e proteger. Segundo Claudio Castro, é necessário que haja diálogo com a imprensa e lembrou que o debate de ideias é importante, mas existe necessidade de preservar e respeitar “ambos os lados”.

Na manhã de terça-feira (08/12), um dos jornais em que trabalha o jornalista citado pela tenente-coronel, publicou uma matéria dizendo que o consumo de munições explodiu no batalhão de Policiais Militares que são investigados pelo hominídio da primas Emilly e Rebecca, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, na última sexta-feira (04/12).

Em resposta à matéria, a porta-voz da Polícia Militar divulgou um vídeo, em rede social da PMERJ, afirmando que a corporação foi surpreendida com a matéria que julgou ser “mentirosa” e informou que o jornalista “de forma maldosa dá a entender que houve um aumento no consumo de munição por um batalhão da PM”.

A porta-voz disse, ainda, que o consumo de munição do batalhão citado pela matéria, não sofreu alterações significativas, e que representa menos de 10% do consumo que foi descrito pelo jornalista que assina a matéria.

No vídeo, a oficial afirma que o jornalista, ao escrever a matéria está se “aproveitando de uma comoção nacional para colocar a população contra a Polícia Militar”.

Posicionamento da Policia Militar

A Policia Militar do estado do Rio de Janeiro (PMERJ), por meio de nota, disse que assim como demais instituições, está, constantemente, sob avaliação crítica de setores da sociedade, como a imprensa e que a PM acolhe criticas construtivas e “todos devem buscar o equilíbrio em sua forma de atuação e evoluir para prestar melhores serviços à sociedade”.

O texto divulgado pela PM lembra, ainda, que a corporação é formada por “homens e mulheres que se sentem atingidos quando as respostas a essas críticas não são acolhidas na sua integralidade”.

Para a PMERJ, quando o trabalho é realizado de forma dividida “crescem os verdadeiros inimigos da ordem e da democracia” e que ao “personalizar esse descontentamento em um repórter, ultrapassou um limite que feriu o equilíbrio de sua atuação”. E ressaltou: “Reconhecemos o valor da liberdade de imprensa”.

ABRAJI

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), divulgou uma nota repudiando a atitude da porta-voz.

Segundo a ABRAJI, o jornalista assinou a reportagem amparado em documentos públicos internos produzidos pela PM. E que após a divulgação do vídeo da porta-voz da Policia Militar, o jornalismo passou a ser ofendido em redes sociais.

Confira abaixo a nota da ABRAJI:

Abraji condena ataque da PMRJ contra repórter Rafael Soares

No começo da noite da terça-feira (08.dez.2020), a Polícia Militar do Rio de Janeiro publicou, nas redes sociais da corporação, um vídeo de dois minutos com ofensas e acusações infundadas contra o jornalista Rafael Soares, que cobre segurança pública para os jornais O Globo e Extra. Na tarde de 09.dez.2020, a tenente-coronel responsável pelo vídeo foi exonerada do cargo de porta-voz.

Amparado em documentos públicos internos produzidos pela PM, o jornalista assinou a reportagem sobre o aumento do uso e do descarte da munição usada por policiais do 15º BPM, em Caxias, região da Baixada Fluminense – o mesmo batalhão de policiais investigados pela morte das meninas Emilly e Rebecca, atingidas por um tiro de fuzil quando brincavam na porta de casa, na sexta-feira passada (04.dez.2020).

No vídeo, a tenente-coronel Gabryela Dantas, coordenadora de comunicação social e porta-voz da PM fluminense, classifica a reportagem como “maldosa”, “irresponsável”, “covarde”, “mentirosa” e “inescrupulosa”. Também acusa o autor de fazer ilações sem fundamento sobre o consumo de munições.

Ainda segundo a porta-voz, Rafael Soares se aproveitou “da comoção nacional (a morte de mais duas crianças negras) para colocar a população contra a Polícia Militar”. Ela insinua que o repórter, mesmo depois de ter procurado a PM, ignorou a contestação dos dados fornecidos pela equipe de Comunicação. A tenente-coronel ignora que a matéria publicada tem a versão da PM incluída.

Nos últimos segundos do vídeo, a tenente-coronel dá a entender que o trabalho do repórter – que “ao longo dos anos” teria tentado rotular as tropas da corporação – poderia ter evitado a morte do cabo Derinaldo Cardoso dos Santos, baleado em Mesquita, também na Baixada Fluminense. Mas a oficial não detalha como o trabalho crítico da imprensa poderia interferir na morte de policiais durante um assalto.

A convocação para divulgar de forma massiva o vídeo teve efeito imediato. Em menos de uma hora, Rafael Soares foi obrigado a fechar suas redes sociais devido a centenas de notificações de ofensas, inclusive pedindo a prisão dele.

O linchamento virtual continuou nas últimas horas. A deputada federal Major Fabiana (PSL-RJ), PM reformada, escreveu: “Que a classe jornalística entenda o recado e comporte-se com ética. É só o começo”. Outros parlamentares do mesmo partido também convocaram seus apoiadores, como o deputado estadual Anderson Moraes (PSL-RJ), que chamou Rafael e os jornalistas de “vermes defensores de vagabundos”. Dois deputados oriundos da PM do Rio também ecoaram as hostilidades.

Apesar da exoneração da tenente-coronel, o vídeo com os ataques ao jornalista continuava circulando até a emissão desta nota, às 16h15.

A Abraji manifesta solidariedade a Rafael Soares. A incitação da população contra o jornalista mostra não só falta de respeito à liberdade de imprensa, mas claro objetivo de intimidar o repórter.

Diretoria da Abraji, 09 de dezembro de 2020.

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