G20 Social: Declaração final destaca propostas globais para combate à fome, sustentabilidade e governança global
[Foto: Rafa Neddermeyer / Audiovisual G20]
O G20 Social divulgou, neste sábado (16/11), no Rio de Janeiro, o documento final do encontro realizado entre os dias 14 e 16 de novembro. A declaração reúne propostas consensuadas por movimentos sociais e organizações da sociedade civil, com foco no combate à fome, sustentabilidade e reformas na governança global. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, anfitrião da cúpula, será responsável por entregar as demandas aos líderes do G20, cuja reunião ocorrerá nos dias 18 e 19 de novembro.
Principais Propostas da Declaração
1. Combate à Fome, à Pobreza e à Desigualdade:
- Adesão global à Aliança contra a Fome e a Pobreza, com alinhamento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
- Estabelecimento de um fundo internacional para financiar políticas públicas de combate à fome e promoção da soberania alimentar.
- Valorização de economias inclusivas, como cooperativas e a economia solidária, além da formalização do mercado de trabalho e ampliação de direitos sindicais.
- Enfrentamento do trabalho escravo, infantil e do tráfico humano.
2. Sustentabilidade e Transição Justa:
- Redução de emissões de gases de efeito estufa e proteção de florestas tropicais por meio do Fundo Floresta Tropical para Sempre (TFFF).
- Compromisso com a transição para uma economia de baixo carbono, promovendo a justiça climática e enfrentando o racismo ambiental.
- Garantia de financiamento climático através de novos objetivos globais e proteção dos oceanos.
3. Reforma da Governança Global:
- Reforma do Conselho de Segurança da ONU para ampliar a representatividade de países do Sul Global.
- Promoção do multilateralismo, democracia e participação direta da sociedade civil.
- Implementação de justiça fiscal, com taxação progressiva sobre grandes fortunas para financiar políticas sociais e ambientais.
Inclusão Social e Participação Plural
A declaração ressalta o compromisso com a inclusão de mulheres, negros, povos indígenas, LGBTQIA+, jovens, pessoas com deficiência, trabalhadores formais e informais, além de populações vulneráveis, como migrantes e refugiados.
Conclusão: Chamado à Ação
O documento final apela aos líderes do G20 por compromissos concretos para enfrentar as desigualdades, as mudanças climáticas e promover a paz global. Segundo o G20 Social, o momento exige liderança, solidariedade e vontade política para transformar as diretrizes propostas em ações efetivas.
A Declaração Final será entregue ao presidente Lula para que as demandas integrem a agenda oficial do G20, buscando reforçar a participação da sociedade civil nos debates globais e promover mudanças estruturais no cenário internacional.
Confira, a seguir, a reprodução integral da Declaração Final do G20 Social.
G20 Social
DECLARAÇÃO FINAL
A Cúpula Social do G20, reunida entre os dias 14 e 16 de novembro, no Rio de Janeiro, ao final do amplo processo de participação do G20 Social, convocado pela Presidência Brasileira do G20, dirige aos líderes mundiais, que se reunirão entre os dias 18 e 19 de novembro, na Cúpula do G20, a seguinte DECLARAÇÃO sobre as principais propostas da sociedade civil global, consensuadas durante os trabalhos realizados ao longo do ano, em torno dos três temas centrais da presidência brasileira do G20:
Combate à Fome, à Pobreza e à Desigualdade;
Sustentabilidade, Mudanças do Clima e Transição Justa;
Reforma da Governança Global;
QUEM SOMOS E DE ONDE FALAMOS
Representamos movimentos sociais e organizações da sociedade civil do Brasil e do mundo, reunidos ao final de intensos processos participativos, que buscaram dar voz aos mais diversos segmentos da sociedade global, frequentemente impactados, mas raramente ouvidos nas grandes decisões geopolíticas e macroeconômicas conduzidas por um seleto grupo de mandatários…
Durante esses meses de trabalho, buscamos incorporar as demandas, reivindicações e propostas historicamente construídas pelas organizações e movimentos de mulheres, negros e negras, povos originários e indígenas, comunidades tradicionais, pessoas com deficiências, LGBTQIA+, jovens, crianças, adolescentes, pessoas idosas, populações deslocadas ou em situação de rua, migrantes, refugiados e apátridas, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, da economia formal, informal, solidária e de cuidados. Todos clamando por uma reforma da governança global que assegure o fim dos conflitos armados, o desenvolvimento e a justiça socioambiental para si e para todo o planeta.
COMBATE À FOME, À POBREZA E À DESIGUALDADE
Em caráter de urgência e prioridade máxima, é imperiosa a adesão de todos os países do G20 e outros Estados, à iniciativa da Allança Global contra a Fome e a Pobreza. Em alinhamento com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU, essa aliança deve promover a cooperação e a intercooperação entre países e organismos internacionais, estabelecendo um fundo específico para financiar políticas públicas e programas de combate à fome, de forma a garantir o acesso universal à alimentação adequada.
Defendemos a soberania alimentar, a partir da produção de alimentos saudáveis, como um pilar para erradicar o flagelo da fome em cada nação e no plano global. Os povos devem ter reconhecido o direito de acesso democratizado à terra e à água, de controlar sua própria produção e distribuição de alimentos, com ênfase em práticas agroecológicas e de preservação do meio ambiente. A promoção de uma alimentação saudável deve ser central para assegurar justiça socioambiental, garantindo que todos os grupos sociais, independentemente de raça, classe, gênero ou origem, tenham acesso igualitário aos benefícios ambientais, respeitando as culturas alimentares tradicionais e evitando a mercantilização dos recursos naturais. Reafirmamos a centralidade do trabalho decente, conforme os padrões da OIT, como elemento essencial na superação da pobreza e das desigualdades. É crucial combater o trabalho escravo, infantil, o tráfico humano e todas as demais formas de exploração e de precarização do trabalho. Enfatizamos a defesa da formalização do mercado de trabalho e de economias inclusivas e contra-hegemónicas, como a economia popular e solidária, cooperativas, cozinhas solidárias e o reconhecimento e valorização da economia de cuidados. É essencial assegurar que todos, especialmente jovens, população negra, mulheres e os mais vulneráveis, tenham acesso a empregos dignos, sistemas de seguridade e proteção social e à ampliação dos direitos sindicais.
SUSTENTABILIDADE, MUDANÇAS DO CLIMA E TRANSIÇÃO JUSTA
Os mesmos dilemas que atingem milhões de pessoas vítimas da fome, das desigualdades e da pobreza refletem-se no descompromisso da maioria dos países desenvolvidos e de suas elites com o enfrentamento das mudanças climáticas e o aquecimento global. As populações mais afetadas pela fome e pela pobreza são as que mais sofrem com as emergências climáticas e desastres naturais, que se tornam mais intensos e frequentes em todo o mundo.
Reiteramos a urgência de enfrentar as mudanças climáticas, com respeito à ciência e os conhecimentos tradicionais dos nossos povos, destacando a importância dos compromissos de adaptação e mitigação no âmbito da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) e do Acordo de Paris. É uma exigência ética que os líderes mundiais assumam um compromisso firme com a redução de emissões de gases de efeito estufa e do desmatamento, bem como a proteção dos oceanos, condições essenciais para limitar o aquecimento global a 1,5°C e evitar danos irreversíveis ao planeta.
A transição justa, como processo de transformação socioeconômica para um modelo sustentável, deve ser o principio norteador para substituir o modelo de produção baseado em combustíveis fósseis por uma economia de baixo carbono. Essa transformação precisa enfrentar a exclusão social, a pobreza energética e o racismo ambiental, e garantir condições equitativas para trabalhadores e trabalhadoras, pessoas negras e comunidades vulneráveis. Reforçamos que essa transição exige um esforço relevante de educação ambiental, participação social e formação cidadã.
Precisamos reforçar, também, a proteção de nossas florestas tropicais através da criação do Fundo Floresta Tropical para Sempre (TFFF), um mecanismo de financiamento internacional dedicado à sua proteção e inclusão socioprodutiva das populações que delas vivem e as mantém em pé. Este fundo, somado a um Novo Objetivo Quantificado Coletivo (NCQC) de financiamento climático, fortalecerá a articulação global necessária para preservar o meio ambiente, garantindo o apoio financeiro contínuo para conservar a biodiversidade e enfrentar a crise climática de forma eficaz.
REFORMA DA GOVERNANÇA GLOBAL
Para atingir esses objetivos, reivindicamos a necessária e inadiável reforma do modelo atual de governança global, que já se mostrou incapaz de oferecer respostas aos desafios contemporâneos e a manutenção da paz.
Assim, enfatizamos a necessidade inadiável de reforma das instituições internacionais para que reflitam a realidade geopolítica contemporânea, com a promoção do multilateralismo e ampliação da participação dos governos e povos dos países do Sul Global nos fóruns decisórios. Em especial, a reforma do Conselho de Segurança da ONU é imprescindível para garantir a diversidade de vozes globais e promover soluções mais equilibradas e eficazes frente aos desafios atuais.
Defendemos que esta reforma abrace a premissa da promoção da democracia e da da participação da sociedade civil. A democracia está em risco quando forças de extrema direita promovem desinformação, discursos totalitários e autoritários, atentando contra os direitos humanos e veiculando mentira, ódio, preconceito, xenofobia, etarismo, racismo e violência nas relações sociais e políticas, dentro das fronteiras de cada país e no plano internacional. Defender a democracia implica em defender o Estado Democrático de Direito e a participação direta da população nos mecanismos nacionais e internacionais de regulação das informações. O exercício do direito à transparência e comunicação plural assegura uma governança global inclusiva, conferindo legitimidade e eficácia aos Estados e organismos internacionais. Acreditamos que a justiça fiscal é uma ferramenta fundamental para alcançar o desenvolvimento sustentável. Por isso, defendemos a taxação progressiva dos super-ricos, com a garantia de que os recursos arrecadados sejam destinados a fundos nacionais e internacionais de financiamento de políticas sociais, ambientais e culturais. Esses e todos os demais fundos aqui reivindicados devem estar regidos por princípios de transparência, controle e participação da sociedade civil.
CONCLUSÃO
Senhores e senhoras líderes do G20, é hora de assumirmos a responsabilidade de liderar uma transformação que seja efetivamente profunda e duradoura. Compromissos ambiciosos são essenciais para fortalecer as instituições internacionais, combater a fome e a desigualdade, mitigar os impactos das mudanças do clima e proteger nossos ecossistemas. Este é o momento de agir com determinação e solidariedade. Com vontade política e a institucionalização de instâncias como a Cúpula Social do G20, podemos, sim, construir uma agenda coletiva que honre o compromisso com a justiça social e com a paz global.
Rio de Janeiro, Brasil, 16 de novembro de 2024.