
[Foto: Ilustrativa / LensGO]
As farmácias e drogarias de todo o Brasil devem passar a reter as receitas médicas para a compra de medicamentos agonistas GLP-1, conhecidos popularmente como canetas emagrecedoras, que incluem remédios como Ozempic, Mounjaro e Wegovy.
A medida, adotada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), foi decidida em abril e entrou em vigor na segunda-feira (23/06). Com a mudança, as receitas devem ser emitidas em duas vias, sendo obrigatória a retenção de uma delas no estabelecimento no momento da venda, procedimento semelhante ao adotado para antibióticos.
Além disso, as receitas devem ter validade de até 90 dias a partir da data de emissão, período no qual o paciente pode utilizar o medicamento. As farmácias e drogarias também devem registrar toda movimentação de compra e venda desses produtos no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC), garantindo maior controle sobre a distribuição dessas substâncias.
Decisão
A nova regra vale para substâncias como semaglutida, liraglutida, dulaglutida, exenatida, tirzepatida e lixisenatida.
Segundo a Anvisa, o controle mais rígido tem como objetivo proteger a saúde da população. A Agência citou dados que indicam um número elevado de eventos adversos no Brasil relacionados ao uso desses medicamentos fora das indicações aprovadas. A comparação com os dados internacionais apontou que o país apresenta notificações significativamente maiores.
O diretor-presidente substituto da ANVISA, Rômison Rodrigues Mota, alertou sobre os riscos da popularização dos medicamentos com fins estéticos, sem acompanhamento médico. “Estamos falando de medicamentos novos, cujo perfil de segurança a longo prazo ainda não é totalmente conhecido. Por isso, é fundamental o monitoramento e a vigilância”, afirmou em seu voto.
Medicamentos
Com o objetivo de orientar consumidores e profissionais de saúde, a ANVISA disponibilizou a lista de medicamentos agonistas do receptor GLP-1 autorizados para uso no Brasil. Esses medicamentos, conhecidos como “canetas emagrecedoras”, são indicados para o tratamento de diabetes tipo 2 ou obesidade, conforme especificado em cada registro.
Abaixo, você pode conferir os medicamentos registrados, suas indicações e as empresas responsáveis pela fabricação, conforme dados da própria Agência.
Medicamentos agonistas GLP-1 registrados pela Anvisa
Nome Comercial | Princípio Ativo | Indicação | Data do Registro | Empresa |
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Soliqua® | insulina glargina + lixisenatida | Diabetes tipo 2 | 16/09/2002 | Sanofi Medley |
Victoza® | liraglutida | Diabetes tipo 2 | 29/03/2010 | Novo Nordisk |
Trulicity® | dulaglutida | Diabetes tipo 2 | 31/08/2015 | Eli Lilly |
Saxenda® | liraglutida | Obesidade/sobrepeso | 29/02/2016 | Novo Nordisk |
Xultophy® | insulina degludeca + liraglutida | Diabetes tipo 2 | 03/04/2017 | Novo Nordisk |
Ozempic® | semaglutida | Diabetes tipo 2 | 06/08/2018 | Novo Nordisk |
Rybelsus® | semaglutida | Diabetes tipo 2 | 26/10/2020 | Novo Nordisk |
Wegovy® | semaglutida | Obesidade/sobrepeso | 02/01/2023 | Novo Nordisk |
Mounjaro® | tirzepatida | Diabetes tipo 2 | 25/09/2023 | Eli Lilly |
Povitztra® | semaglutida | Obesidade/sobrepeso | 12/08/2024 | Novo Nordisk |
Extensior® | semaglutida | Diabetes tipo 2 | 14/10/2024 | Novo Nordisk |
Lirux | liraglutida | Diabetes tipo 2 | 24/12/2024 | EMS |
Olire | liraglutida | Obesidade/sobrepeso | 24/12/2024 | EMS |
Off label
A nova medida não impede que os profissionais médicos continuem a prescrever os medicamentos agonistas GLP-1 para usos diferentes dos descritos na bula. Essa prática, conhecida como uso “off label”, é permitida quando o médico avalia que os benefícios do tratamento superam os riscos para um paciente específico.
O uso “off label” é uma decisão clínica tomada com base na experiência do profissional e nas particularidades de cada caso. Embora o medicamento não tenha sido aprovado oficialmente para determinada finalidade, o médico pode optar por essa abordagem desde que haja justificativa técnica e acompanhamento adequado.
Segundo a ANVISA, ao adotar essa esse recurso, torna- se essencial que o paciente seja devidamente informado sobre o uso alternativo do medicamento, cabendo ao médico explicar os potenciais riscos e benefícios envolvidos, assegurando que a decisão seja compartilhada de forma consciente e responsável.
Entidades
Em fevereiro deste ano, as principais entidades médicas do país que atuam nas áreas de endocrinologia, diabetes e obesidade emitiram um alerta conjunto sobre os riscos do uso de medicamentos injetáveis de origem duvidosa no tratamento dessas doenças. A nota oficial foi assinada pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) e pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO).
O comunicado enfatiza que medicamentos como semaglutida e tirzepatida, usados para tratar obesidade e diabetes, exigem alto rigor tecnológico em sua fabricação. Essas substâncias são compostos proteicos administrados por injeção subcutânea e requerem padrões elevados de esterilidade e estabilidade térmica, além de aprovação por órgãos reguladores como a Anvisa e a FDA.
As entidades alertaram que o uso de versões manipuladas ou alternativas desses medicamentos tem se tornado uma prática preocupante. Segundo a nota, essas versões não passam por testes de bioequivalência e não possuem comprovação de eficácia, segurança ou estabilidade, o que pode expor os usuários a sérios riscos à saúde. A SBEM, a SBD e a ABESO também citam que há relatos da FDA sobre contaminações, alterações nas doses e substituições de compostos em versões manipuladas.
Além dos riscos à saúde, a comercialização direta dessas medicações por profissionais de saúde, em consultórios, é considerada uma infração ao Código de Ética Médica. A nota alerta ainda para a venda por redes sociais, sites e aplicativos, o que aumenta as chances de adulteração e perda de eficácia por instabilidade térmica.
Recomendações das entidades médicas
- Os profissionais de Saúde não prescrevam semaglutida ou tirzepatida alternativas ou manipuladas. Apenas utilizem medicamentos aprovados por agências reguladoras, com fabricação industrial certificada e vendidos em farmácias;
- Os pacientes rejeitem tratamentos que incluam versões alternativas ou manipuladas dessas moléculas, vendas diretas em sites, aplicativos ou em consultórios e busquem alternativas aprovadas pela Anvisa;
- Os órgãos reguladores e fiscalizadores, em especial ANVISA e Conselhos de Medicina, intensifiquem as ações de fiscalização sobre todas a fases, empresas e pessoas envolvidas nessa prática.
Por fim, a SBEM, a SBD e a ABESO reforçaram a importância de seguir recomendações científicas e éticas e se comprometem com a defesa de políticas públicas que ampliem o acesso a medicamentos seguros e eficazes no tratamento da obesidade e do diabetes.
Canetas adulteradas
A exigência da ANVISA para retenção de receita médica na compra de medicamentos agonistas do GLP-1, como o Ozempic, também pode ajudar a combater a circulação de versões falsificadas, que se tornaram comuns no mercado paralelo do Brasil. A médica nutróloga Fernanda Vasconcelos, fundadora do Instituto Qualitté, alerta para os riscos à saúde envolvidos no uso dessas canetas adulteradas.
“á vi casos de hipoglicemia severa porque a caneta estava contaminada ou tinha sido substituída por insulina. O perigo é real, e as pessoas precisam entender que emagrecimento não pode ser feito a qualquer custo”, afirma a médica. Ela ressalta que essas substâncias exigem condições específicas de armazenamento e controle de qualidade, e qualquer irregularidade pode comprometer gravemente a segurança do tratamento.
Segundo a nutróloga, as canetas originais, como Mounjaro, Ozempic e Saxenda, contêm fórmulas sensíveis à temperatura e devem ser mantidas refrigeradas entre 2°C e 8°C. Quando são expostas a temperaturas inadequadas ou manipuladas de forma clandestina, podem perder a eficácia e até provocar reações imprevisíveis no organismo.
Ainda de acordo com Fernanda Vasconcelos, é fundamental que os pacientes saibam reconhecer os sinais de que o produto pode ser falsificado. Entre as principais recomendações estão evitar preços muito abaixo do mercado, não comprar medicamentos em redes sociais ou com vendedores informais, verificar se houve o armazenamento correto do produto e jamais compartilhar a medicação. A médica reforça que “o uso deve ser individual e sempre com prescrição médica”.
As orientações da médica reforçam a importância da medida adotada pela Anvisa e destacam a necessidade de responsabilidade tanto por parte dos profissionais de saúde quanto dos consumidores, diante do uso crescente das chamadas canetas emagrecedoras.
*Com informações de ANVISA