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Juiz decide que inserção e remoção de DIU, no DF e Territórios, é ato privativo do médico

[Foto: Ilustrativa]

O Juiz Federal Substituto da 3ª Vara Federal/SJDF, Dr. Bruno Anderson Santos da Silva, decidiu, no último dia 28 (28/03), em processo na 3ª Vara Federal Cível da SJDF, “reconhecer que o procedimento de inserção e remoção de DIU, no âmbito do Distrito Federal e Territórios, é ato privativo de médico“.

No processo foram apresentadas considerações do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), em defesa da realização dos procedimentos por enfermeiros capacitados, assim como argumentos do Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) que, em seu pedido inicial, defendeu “que a implantação de DIU-DISPOSITIVO INTRAUTERINO, é ato exclusivo de médico, não podendo ser praticado por enfermeiros ou quaisquer outros auxiliares, visto que tal prática é exclusiva da medicina“.

Segundo o COFEN, a realização do procedimento por enfermeiros “é uma realidade na maioria dos países civilizados há décadas, sem que seja verificado aumento de intercorrências“.

A RESOLUÇÃO COFEN Nº 690/2022, reproduzida integralmente no final dessa matéria, trata do tema e afirma que “A inserção e retirada do DIU deve ser realizada pelo Enfermeiro, no âmbito do Sistema Único de Saúde-SUS, na Atenção Primária e Especializada à Saúde, em ambiente institucional, inserido na rede de atenção à saúde, seguindo protocolos assistenciais, normas e rotinas e Procedimentos Operacionais Padrão-POP, e buscando a garantia do acesso e integralidade da assistência no campo do Planejamento Familiar e Reprodutivo.”

Em seu website, o CRM-DF publicou a seguinte afirmação: “Com base em manuais do Ministério da Saúde e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), o Poder Judiciário entendeu que a inserção do dispositivo é uma ação invasiva e, por isso, é ato privativo de médico“.

O COFEN alerta que “O impedimento vale apenas para o DF, em todas as outras unidades da federação continua autorizado o procedimento pela Enfermagem, com base na Lei 7.394/86 e na Resolução Cofen 690/2022, que preconizam a formação necessária para o exercício da especialidade.”.

Confira a seguir a íntegra da decisão no link abaixo.

PROCESSO: 1019277-96.2023.4.01.3400 – AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Confira a seguir a reprodução integral da resolução do COFEN que trata da inserção do dispositivo intrauterino.

RESOLUÇÃO COFEN Nº 690/2022

Normatiza a atuação do Enfermeiro no Planejamento Familiar e Reprodutivo.

O CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM – COFEN, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei nº 5.905, de 12 de julho de 1973 e pelo Regimento da Autarquia, aprovado pela Resolução Cofen nº 421, de 15 de fevereiro de 2012, e

CONSIDERANDO a prerrogativa estabelecida ao Cofen no artigo 8º, incisos IV, V e XIII, da Lei nº 5.905/73, de baixar provimentos e expedir instruções, para uniformidade de procedimento e bom funcionamento dos Conselhos Regionais, dirimir as dúvidas suscitadas pelos Conselhos Regionais e exercer as demais atribuições que lhe são conferidas por lei;

CONSIDERANDO que o artigo 15, inciso II, III, IV, VIII e XIV, da Lei nº 5.905/73, dispõe que compete aos Conselhos Regionais de Enfermagem: disciplinar e fiscalizar o exercício profissional, observadas as diretrizes gerais do Conselho; fazer e executar as instruções e provimentos do Conselho Federal; manter o registro dos profissionais com exercício na respectiva jurisdição; conhecer e decidir os assuntos atinentes à ética profissional impondo as penalidades cabíveis; e exercer as demais atribuições que lhes forem conferidas por esta Lei ou pelo Conselho Federal;

CONSIDERANDO a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, e o Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987, que regulamentam o exercício da Enfermagem no país;

CONSIDERANDO que a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) definiu que são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (art. 6º da CF/1988);

CONSIDERANDO o § 7º, do art. 226 da Constituição Federal: fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas;

CONSIDERANDO a Lei nº 9.623, de 12 de janeiro de 1996, que define em seu artigo 1º que o planejamento familiar é direito de todo cidadão, observado o disposto nesta Lei; e que o art. 5º define que é dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde, em associação, no que couber, às instâncias componentes do sistema educacional, promover condições e recursos informativos, educacionais, técnicos e científicos que assegurem o livre exercício do planejamento familiar;

CONSIDERANDO o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, aprovado pela Resolução Cofen nº 564/2017;

CONSIDERANDO a Resolução Cofen nº 429, de 30 de maio de 2012, que dispõe sobre o registro das ações profissionais no prontuário do paciente e em outros documentos próprios da Enfermagem, independente do meio de suporte – tradicional ou eletrônico;

CONSIDERANDO a Portaria MS nº 2.436, de 21 de setembro de 2017, que aprova a Política Nacional de Atenção Básica-PNAB, e traz como atribuições do Enfermeiro na Atenção Primária à Saúde a realização da consulta de enfermagem, procedimentos, solicitação de exames complementares, prescrição de medicações conforme protocolos, diretrizes clínicas e terapêuticas, ou outras normativas técnicas estabelecidas pelo gestor federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal, observadas as disposições legais da profissão;

CONSIDERANDO o Caderno de Atenção Básica nº 26, de 2013, que trata das atribuições da equipe de Saúde da Família na Saúde Sexual e Reprodutiva, que aborda a qualidade de vida, de saúde das pessoas e o papel fundamental que as equipes de Atenção Básica/Saúde da Família têm na promoção da saúde sexual e da saúde reprodutiva;

CONSIDERANDO que a oferta universal de métodos para o Planejamento Familiar é um dos meios de garantir os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, tais como métodos comportamentais, métodos de barreira, métodos hormonais, Dispositivo Intrauterino (DIU) e métodos definitivos;

CONSIDERANDO que, no Brasil, a redução da mortalidade materna está relacionada à ampliação da rede pública de saúde, principalmente com a expansão do modelo da Estratégia de Saúde da Família, que proporciona aumento da cobertura das ações obstétricas e de Planejamento Familiar, o que corrobora com as metas do Desenvolvimento Sustentável do Milênio de que, até 2030, seja assegurado o acesso universal aos serviços e insumos de saúde sexual e reprodutiva, incluindo o Planejamento Familiar, à informação e educação, bem como a integração da saúde reprodutiva em estratégias e programas nacionais;

CONSIDERANDO que a redução das desigualdades, por meio do acesso aos serviços de saúde, é uma das premissas da Atenção Primária à Saúde e que o envolvimento de profissionais qualificados para ações de planejamento sexual e reprodutivo aumenta a possibilidade das mulheres de obterem acesso aos métodos de concepção e contracepção;

CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do Cofen em sua 537ª Reunião Ordinária, e tudo o mais que consta no Processo Administrativo Cofen nº 1092/2021;

RESOLVE:

Art. 1º Aprovar a norma técnica referente à atuação do Enfermeiro no Planejamento Familiar e Reprodutivo no âmbito do Sistema Cofen/Conselhos Regionais de Enfermagem.

Art. 2º No âmbito da equipe de Enfermagem, a atuação no Planejamento Familiar e Reprodutivo é privativa do Enfermeiro, observadas as disposições legais da profissão.

Art. 3º Os procedimentos previstos nesta norma devem ser desenvolvidos no ato da consulta em cumprimento às etapas do Processo de Enfermagem, cabendo-lhe a prescrição, administração e procedimentos acerca dos métodos conceptivos e contraceptivos disponíveis no SUS, com base em protocolos assistenciais.

Art. 4º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.

Brasília, 3 de fevereiro de 2022.

BETÂNIA Mª P. DOS SANTOS
COREN-PB Nº 42725
Presidente

SILVIA MARIA NERI PIEDADE
COREN-RO Nº 92597
Primeira-Secretária

ANEXO DA RESOLUÇÃO Nº 690/2022

Norma técnica da atuação do Enfermeiro no Planejamento Familiar e Reprodutivo

I. Métodos:

1. Métodos de barreira: Previnem a concepção impedindo que os espermatozoides se aproximem dos óvulos, seja por bloqueio mecânico ou químico. São exemplos de anticoncepcionais de barreira os preservativos masculinos e femininos, o diafragma, os espermaticidas, o capuz cervical e as esponjas vaginais.

2. Métodos hormonais: Previnem a gravidez por interferirem no ciclo ovariano, na capacidade de o endométrio acomodar o embrião ou na migração e capacitação dos espermatozoides. Dependendo do método, podem ser administrados por via oral, injetável, subcutânea, percutânea, vaginal ou intrauterina.

3. Métodos comportamentais: São técnicas de identificação dos sinais de ovulação pelas mulheres. Para evitar a concepção, as relações sexuais são concentradas em períodos não férteis. Exemplos de métodos são a tabela, a percepção da temperatura corporal basal, a avaliação de alterações no muco cervical e a combinação destes. O coito interrompido e a relação sexual sem penetração, também considerado métodos comportamentais de anticoncepção, objetivam a não ejaculação dentro do canal vaginal. Os métodos comportamentais são pouco recomendados para adolescentes, pois a eficácia destes depende de disciplina e planejamento das relações sexuais. Além disso, o ciclo menstrual é comumente irregular nessa faixa etária.

4. Método de lactação e amenorreia: A menstruação e a fertilidade são inibidas durante a amamentação. Isso ocorre pelos elevados níveis de prolactina e consequente inibição da liberação de gonadotrofinas pela hipófise. Esse método é dependente da intensidade de sucção e produção de leite.

5. Dispositivos Intrauterinos: O DIU (não hormonal), após sua inserção, atua fisiologicamente dificultando a passagem dos espermatozoides pelo trato reprodutivo feminino, além de promover reação inflamatória ou reação à presença de corpos estranhos à cavidade uterina. Isso prejudica a integridade dos espermatozoides e reduz a probabilidade de fecundação. Ressalta-se que a técnica de inserção do DIU não compromete a estrutura celular e tecidual do útero.

a. Ressalta-se que, a partir do escopo de conhecimentos dos Tratados de Anatomia Humana, o útero é um órgão fibromuscular, localizado na cavidade pélvica. Recebe as tubas ou trompas uterinas na parte mais superior, já na parte inferior continua-se com a vagina. O útero localiza-se sobre a vagina, entre a bexiga urinária e o reto;

b. A inserção do DIU ocorre com a introdução do dispositivo no espaço uterino, em continuidade ao espaço vaginal, não interferindo em estruturas anatômicas e contribui para a recuperação físico-funcional das mulheres, evitando gravidez indesejada e contribuindo para a redução da mortalidade materna-infantil;

c. A inserção e retirada do DIU possuem caráter de ação como método de concepção e contracepção, tendo objetivo de influenciar ou interferir no processo de recuperação físico-funcional e não comprometendo estrutura celular e tecidual;

d. A inserção e retirada do DIU deve ser realizada pelo Enfermeiro, no âmbito do Sistema Único de Saúde-SUS, na Atenção Primária e Especializada à Saúde, em ambiente institucional, inserido na rede de atenção à saúde, seguindo protocolos assistenciais, normas e rotinas e Procedimentos Operacionais Padrão-POP, e buscando a garantia do acesso e integralidade da assistência no campo do Planejamento Familiar e Reprodutivo.

6. Métodos cirúrgicos: Existem métodos anticoncepcionais tidos como definitivos. É o caso dos métodos cirúrgicos. Exemplos desses métodos são a laqueadura tubária e a vasectomia. São recomendados apenas em casos de necessidades clínicas ou genéticas para a prevenção da gravidez, portanto, não são recomendados para adolescentes. O enfermeiro na consulta de Planejamento Familiar e Reprodutivo, seguindo os parâmetros estabelecidos na Lei nº 9.623/1996, pode encaminhar a pessoa cuidada para os serviços de referência.

II. Competência do Enfermeiro:

1. Compete ao Enfermeiro:

a. Realizar a consulta de Enfermagem, cabendo-lhe a solicitação de exames, prescrição, administração e procedimentos, pautados nos protocolos institucionais, acerca da promoção, proteção e apoio à utilização dos métodos de concepção e contracepção, garantindo a qualidade e a segurança do uso no cotidiano da vida reprodutiva;

b. Realizar o Planejamento Familiar e Reprodutivo com ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a concepção e contracepção;

c. Participar na elaboração de protocolos assistenciais, normas e rotinas, Procedimentos Operacionais Padrão-POP, de acordo com as melhores práticas baseadas em evidências científicas;

d. Participar no processo de avaliação, escolha, indicação e implementação de novos métodos e tecnologias para a concepção e contracepção;

e. Realizar a inserção, revisão e retirada de Dispositivo Intrauterino-DIU;

f. Registrar os dados obtidos durante a realização da inserção, revisão e retirada do DIU, no prontuário da paciente ou na ficha de atendimento, de forma clara e objetiva, contemplando a descrição do procedimento e as devidas tomadas de decisão.

III. Capacitação:

O desenvolvimento de ações no Planejamento Familiar e Reprodutivo deve oportunizar processos formativos com tempo definido, no intuito de desenvolver reflexões, conhecimentos, competências, habilidades e atitudes específicas, através dos processos de Educação Continuada, igualmente como estratégia para a qualificação da Atenção Primária e Especializada à Saúde.

As ofertas educacionais devem, de todo modo, ser associadas às temáticas relevantes para a Atenção Primária e Especializada à Saúde, e da dinâmica cotidiana de trabalho dos profissionais.

1. Geral:

a. Conhecer a legislação do exercício profissional da Enfermagem;

b. Conhecer a legislação vigente da assistência ao Planejamento Familiar e Reprodutivo;

c. Apoderar-se acerca dos métodos de concepção e contracepção disponíveis no Sistema Único de Saúde;

d. Aprimorar métodos e técnicas para a realização da Consulta de Enfermagem no Planejamento Familiar e Reprodutivo como ferramenta tecnológica para garantir a assistência de enfermagem qualificada e segura;

e. Manter-se atualizado, com base nas evidências científicas, para a prática do Planejamento Familiar e Reprodutivo.

2. Inserção, revisão e retirada de DIU:

a. Ter curso de capacitação, presencial, em Inserção, revisão e retirada de DIU, com carga horária mínima de 70 (setenta) horas, sendo no mínimo 20 (vinte) horas teóricas e teórico-práticas e 50 (cinquenta) horas práticas, com no mínimo 20 (vinte) inserções supervisionadas durante consulta de Enfermagem nos serviços de saúde;

b. Manter-se atualizado técnica e cientificamente, de acordo com as revisões de protocolos assistenciais, normas e rotinas, Procedimentos Operacionais Padrão-POP, com base nas melhores práticas assistenciais baseadas em evidências científicas.

IV. Áreas de Atuação do Enfermeiro no Planejamento Familiar e Reprodutivo:

1. Atenção Primária à Saúde – APS;

2. Atenção Especializada à Saúde – AES.

Brasília, 4 de fevereiro de 2022.

Reprodução do texto da RESOLUÇÃO COFEN Nº 690/2022, do Conselho Federal de Enfermagem, disponível em http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-690-2022_96063.html/print/.

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