
[Foto:Ilustrativa / Geraldo Magela / Agência Senado]
A delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, pode perder validade jurídica após a acareação com o general Walter Braga Netto no Supremo Tribunal Federal (STF), segundo avaliação da advogada criminalista e mestre em Direito Penal Jacqueline Valles.
Cid e Braga Netto estiveram frente a frente na terça-feira (24/06), em sessão conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes. Durante o procedimento, os dois teriam apresentado versões conflitantes, especialmente sobre a suposta entrega de uma caixa de vinho com dinheiro, citada na colaboração de Cid.
Segundo Jacqueline Valles, “o que Cid falou para ter benefício da delação tem que ser verdadeiro. Se ele mentiu em algum ponto, isso prejudica o acordo. Porém, se dessa mentira a polícia conseguiu extrair provas derivadas que são coerentes e posteriormente comprovadas como verdadeiras, essas provas serão válidas para o processo”.
A advogada também pontuou que a postura de Cid diante das perguntas pode ser determinante para a avaliação da credibilidade de seu depoimento. “a acareação serve exatamente para demonstrar a fidedignidade de todos os depoimentos. Quando o Cid não responde às indagações sobre o dinheiro, o envelope, o local, demonstra uma fragilidade no que ele falou, e isso pode influenciar tanto nas provas como na própria delação em termos de benefício para ele.”
Apesar das inconsistências, Jacqueline esclarece que as provas obtidas a partir da delação podem permanecer válidas no processo, mesmo que o acordo venha a ser anulado. “A delação dele está começando a respingar de forma prejudicial para ele. Ele pode perder benefícios caso fique comprovado que mentiu.”
A especialista também comentou sobre a discussão em torno da gravação da acareação, que foi questionada pela defesa de Braga Netto. Para ela, a prerrogativa do advogado gravar esse tipo de procedimento está amparada legalmente. “A ação é penal pública. A mídia não pode gravar porque pode interferir na imagem das pessoas. Mas o advogado tem a prerrogativa de gravar a acareação para produzir uma prova do próprio cliente falando. Partindo da base que a ação penal é pública, qualquer um poderia assistir.”
A acareação integra as investigações que envolvem suspeitas de organização criminosa e tentativa de golpe de Estado. O conteúdo do encontro entre Cid e Braga Netto agora será avaliado no contexto da colaboração premiada, que depende da veracidade e da consistência das informações prestadas para garantir os benefícios legais ao delator.
Acareação
A acareação é um procedimento jurídico no qual pessoas envolvidas em um processo são ouvidas frente a frente, com o objetivo de esclarecer divergências em seus depoimentos. Conforme explicou o ministro Moraes, apenas as testemunhas têm a obrigação legal de dizer a verdade. Réus, por outro lado, têm o direito ao silêncio e não são obrigados a produzir prova contra si mesmos.