
A proposta de criação de novas áreas de conservação ambiental nos estados do Pará e Tocantins tem gerado divergências entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e os produtores locais. Enquanto representantes do ICMBio defendem a implantação dessas unidades, os produtores presentes ao debate manifestaram críticas à iniciativa. O tema foi objeto de audiência pública realizada na última quarta-feira (10) na Comissão de Agricultura (CRA).
O estudo para a criação das Áreas de Proteção Ambiental (APAs) está em andamento no ICMBio, em atendimento a solicitações da Fundação Casa da Cultura de Marabá e da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), protocoladas em outubro de 2023. Pesquisadores ressaltam a relevância ambiental e cultural dessas regiões, que concentram significativa biodiversidade, abrigam comunidades tradicionais e possuem elevado potencial para o desenvolvimento do turismo sustentável.
De acordo com Kelen Leite, do ICMBio, ambas são classificadas como áreas de uso sustentável, o que permite a presença de terras públicas e privadas e garante o desenvolvimento de atividades econômicas, sem imposição de novas restrições.
— Não há nenhum conflito com propriedade privada, e os títulos emitidos não perdem a validade. O principal objetivo é a continuidade das atividades econômicas, seguindo as regras, muito amparadas nas regras já estabelecidas — disse.
Chefe do Núcleo de Gestão Integrada de Carajás (NGI Carajás) do ICMBio, André Luis Vieira explicou que a proposta de criação das APAs surgiu com base em um diagnóstico socioeconômico da região, que indicou a necessidade de compatibilizar a conservação ambiental com as atividades econômicas já existentes.
— Essa sugestão surgiu muito a partir dessa experiência aqui local e que a gente considera exitosa, essa aliança entre a conservação e o setor produtivo que já existe — afirmou.
Mas o advogado do Sindicato Rural de Marabá (PA) e do Sindicato dos Produtores Rurais de Itupiranga (PA), Luís Gustavo Trovo Garcia, demonstrou preocupação com as possíveis restrições decorrentes da criação das unidades de conservação, mesmo sendo classificadas como de uso sustentável. Ele citou, por exemplo, a exigência de comunicar previamente ao ICMBio as atividades desenvolvidas na área, o que, segundo ele, já representa uma forma de limitação, ainda que não haja necessidade de autorização formal.
— Dra. Kelen, permita-me fazer referência à sua fala. Como você bem disse: “Ah, não tem restrições”, mas determinadas atividades, eventualmente, vão ter que ser cientificadas ao ICMBio, ainda que o ICMBio não precise, formalmente, se manifestar. Mas, no simples fato de você ter que comunicar, e o órgão eventualmente entender que deve se pronunciar, já se está impondo uma restrição — argumentou.
Para o presidente da CRA, senador Zequinha Marinho (Podemos–PA), as novas unidades de conservação abrangem áreas produtivas e habitadas há décadas e trazem riscos reais, como insegurança jurídica e fundiária, restrições à produção agropecuária, falta de diálogo com as comunidades e excesso de burocracia.
— Não somos contra a conservação; pelo contrário, defendemos um modelo sustentável que respeite quem vive e produz na região — destacou.
Insegurança para produtores
Morador e produtor dentro de uma unidade de conservação, Marcelo Norkey Pereira, membro do Conselho Gestor da APA Triunfo do Xingu, questionou a real necessidade de criar uma APA em áreas já ocupadas, produtivas e socialmente organizadas, como é o caso das comunidades de pescadores, vazanteiros e produtores rurais que vivem nessas regiões.
— O que o ICMBio não fala é que, quando se zoneia uma área, existem zonas que não poderão ser utilizadas — alertou.
Pereira afirmou que essas limitações acabam gerando insegurança para quem deseja investir em atividades de longo prazo, como o plantio de cacau, ou obter financiamento bancário. Ele citou como exemplo a APA do Igarapé Gelado, criada em 1989, cujo plano de manejo só foi aprovado em 2016, quase três décadas depois.
— Já imaginou um produtor ter que esperar 26 anos para saber se pode ou não usar sua própria terra? Morar dentro de uma unidade de conservação não é fácil, e muitas vezes a realidade é bem diferente do que dizem os discursos institucionais — completou.
O prefeito de Marabá, Toni Cunha, manifestou preocupação com a possibilidade de ampliação das áreas de proteção ambiental no município. Segundo o prefeito, embora as áreas propostas não sejam de proteção integral, é evidente que trarão consequências para quem vive e produz nessas terras.
— Tem duas APAs passando, essas propostas passando pela cidade de Marabá. Estou com medo de Marabá inteira virar uma APA.. Nós não aceitaremos a criação dessas unidades — declarou.
Para o senador Jaime Bagattoli (PL–RO), o país já conta com áreas protegidas em quantidade suficiente. Ele afirmou que a criação de novas APAs contribuiriam para a miséria da população local, especialmente dos pequenos produtores, que enfrentam severas limitações para produzir.
— Quem está por trás disso tudo do ICMBio quer criar uma indústria da miséria na Amazônia — afirmou.
APA Paleocanal do TocantinsA ideia para a APA Paleocanal do Tocantins é criar uma unidade de conservação de uso sustentável que abrange os municípios de Itupiranga, Nova Ipixuna e Marabá, no estado do Pará, com uma área total de 30.745 hectares.
APA do Bico do PapagaioTambém classificada como unidade de uso sustentável, a APA do Bico do Papagaio abrangerá uma área total de 112.641 hectares, distribuída entre municípios de três estados: Marabá, São João do Araguaia e Bom Jesus do Tocantins (PA); São Pedro da Água Branca (MA); Esperantina, São Sebastião do Tocantins e Araguatins (TO).
Senado Federal Da Agência Senado
Fonte: Agência Brasil ou Agência Câmara de Notícias ou Agência Senado ou ONU News