
[Foto: Arquivo / Rosinei Coutinho / SCO / STF]
O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta terça-feira (02/09), às 9h, o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros sete réus acusados de envolvimento em uma trama golpista para tentar reverter o resultado das eleições de 2022. O processo é analisado pela Primeira Turma da Corte. O rito do julgamento segue o Regimento Interno do STF e a Lei nº 8.038/1990, que regulamenta os procedimentos processuais da Corte.
A sessão foi aberta pelo ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma, e teve como primeiro passo a leitura do relatório do caso pelo relator, ministro Alexandre de Moraes. O relatório reúne as etapas desde as investigações até as alegações finais.
Na sequência, a palavra foi concedida ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, responsável pela acusação, com prazo de até duas horas. Em seguida, os advogados de defesa de cada réu têm até uma hora para apresentar suas sustentações orais.
Sessões previstas
O julgamento será realizado em cinco datas durante o mês de setembro:
- 2 de setembro – 9h às 12h e 14h às 19h
- 3 de setembro – 9h às 12h
- 9 de setembro – 9h às 12h e 14h às 19h
- 10 de setembro – 9h às 12h
- 12 de setembro – 9h às 12h e 14h às 19h
Declarações de Alexandre de Moraes
Durante a abertura da sessão, Moraes disse que os acusados tiveram acesso ao devido processo legal, com direito à ampla defesa e ao contraditório. Ele afirmou que, havendo provas de culpa, os réus serão condenados, mas que “qualquer dúvida razoável” levará à absolvição.
Pressões externas e sanções dos EUA
Sem citar nomes, o ministro mencionou condutas que tentam submeter o Judiciário brasileiro “ao crivo de Estado estrangeiro”, classificando-as como “covarde e traiçoeira”. Ele assegurou que tais ações não afetarão a independência dos ministros do STF.
“Essa tentativa de obstrução não afetará a imparcialidade e a independência dos juízes deste Supremo Tribunal Federal”, disse.
O relator também defendeu a soberania nacional, afirmando que será protegida de forma “inflexível”. Ele lembrou que a Corte já enfrentou diversas tentativas de agressão à democracia e reafirmou que não faltará coragem para resistir a ataques contra o Estado de Direito.
“A história deste Supremo Tribunal Federal demonstra que jamais faltou ou jamais faltará coragem aos seus membros para repudiar as agressões dos inimigos da soberania nacional, da democracia, do Estado de Direito ou da independência do Poder Judiciário”, acrescentou.
Desde julho, o governo dos Estados Unidos, presidido por Donald Trump, adotou medidas contra autoridades brasileiras em razão do caso. Entre elas estão a imposição de tarifas de 50% sobre produtos nacionais, a revogação de vistos de ministros do STF e familiares e a inclusão de Moraes na Lei Magnitsky, que prevê sanções a violadores de direitos humanos.
A expectativa, segundo aliados de Bolsonaro, é que uma eventual condenação provoque novas sanções. Grupos bolsonaristas têm condicionado um possível recuo da Casa Branca à aprovação de anistia ampla aos réus.
Polarização e pacificação
Moraes também comentou a polarização política no país. Ele afirmou que a pacificação nacional depende do cumprimento da Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições, e não de medidas de impunidade.
De acordo com o ministro, a impunidade deixa “cicatrizes traumáticas” e enfraquece a democracia. “O caminho aparentemente mais fácil, que é o da impunidade, corrói a democracia e não traz pacificação”, disse, ressaltando que apenas o respeito às regras do jogo democrático pode garantir estabilidade.
“A história nos ensina que a impunidade, a omissão e a covardia não são opções para a pacificação, pois o caminho aparentemente mais fácil – e só aparentemente –, que é o da impunidade, deixa cicatrizes traumáticas na sociedade e corrói a democracia, como, lamentavelmente, o passado recente no Brasil demonstra”, disse.
Crimes em análise
Os oito acusados — entre eles Bolsonaro e ex-auxiliares — respondem pelos crimes de:
- Organização criminosa armada
- Atentado violento contra o Estado Democrático de Direito
- Golpe de Estado
- Dano qualificado por violência e grave ameaça
- Deterioração de patrimônio tombado
Somadas, as penas podem ultrapassar 40 anos de prisão.
Réus
O ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira foi o único entre os oito réus a comparecer presencialmente ao primeiro dia do julgamento . Ao chegar, Nogueira declarou confiar no trabalho da Justiça e nas provas apresentadas pela defesa em suas alegações finais.
“A gente acredita na Justiça e nas provas apresentadas nas nossas alegações finais”, disse Nogueira ao chegar para o julgamento”, disse o ex-ministro.
Já o ex-presidente Jair Bolsonaro, apontado como líder da trama, não compareceu. Segundo seu advogado, Celso Vilardi, Bolsonaro chegou a considerar a presença, mas desistiu por questões de saúde. “Ele não está bem”, disse o advogado.
Os demais réus foram representados por seus advogados. Pela acusação, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, esteve presente, responsável pela denúncia apresentada contra o grupo.
PGR
Durante sua sustentação oral, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou ser “imperativo” punir a tentativa frustrada de ruptura com a ordem democrática.
Segundo Gonet, os atos narrados na denúncia representam um ataque criminal às instituições do país e não podem ser tratados como irrelevantes ou minimizados como meras curiosidades da vida nacional.
Os atos que compõem o panorama espantoso e tenebroso da denúncia são fenômenos de atentado com relevância criminal contra as instituições democráticas. Não podem ser tratados como atos de importância menor, como devaneios utópicos, como aventuras inconsideradas, nem como precipitações a serem reduzidas com o passar dos dias a um plano bonachão das curiosidades tão só irreverentes da vida nacional.”, disse.
O procurador-geral apresentou a denúncia contra Bolsonaro e os ex-auxiliares por tentativa de golpe de Estado e mais quatro crimes. Em sua fala, destacou que, diferentemente de desvios jurídicos que podem ser corrigidos por meio do controle de constitucionalidade, não há medida judicial capaz de conter a tomada de poder pela força.
“A defesa da ordem democrática”, afirmou, encontra respaldo no direito quando o ataque não se consuma. Para Gonet, os atos em julgamento devem ser considerados graves para garantir a preservação do Estado Democrático de Direito.
Ele ainda defendeu que a responsabilização atua como fator de dissuasão contra novas investidas golpistas e reforça a determinação da sociedade em manter a vida pública baseada nos direitos fundamentais e no respeito às escolhas democráticas.
“Opera como elemento dissuasório contra o ânimo por aventuras golpistas e expõe a tenacidade e a determinação da cidadania pela continuidade da vida pública inspirada no protagonismo dos direitos fundamentais e na constância das escolhas essenciais de modo de convivência política”, disse.
Como acompanhar
As sessões são realizadas em Brasília, na sala de audiências da Primeira Turma do STF, e transmitidas ao vivo pela TV Justiça, Rádio Justiça e pelo canal oficial do STF no YouTube.